Quem foi na sede da Academia Brasileira de Literatura de Cordel neste fim de semana pôde ouvir um pouquinho do talento de José João dos Santos, o famigerado Mestre Azulão. O poeta-cantador paraibano mostrou um pouquinho do seu vasto repertório no Encontro com Mestres Populares e Rodas de Cantorias, conforme divulgado anteriormente aqui.
Azulão é poeta experiente. Morador do Rio de Janeiro há 58 anos, foi um dos principais fundadores da feira nordestina de São Cristóvão (RJ), como ele mesmo conta no seu livreto “A feira nordestina, foi assim que começou” (2007), editado pela Tupynanquim editora. É na própria feira que ele possui sua barraquinha de cordéis, onde os vende em grande quantidade. Do Centro Luiz Gonzaga de Tradições Nordestinas (como é nomeada a Feira de São Cristóvão) ele só reclama do barulho das barracas que o impede de recitar no seu local preferido, a praça Catulé da Rocha, bem no centro da feira. Além de ser um grande repentista, Seu Azulão já escreveu mais de 300 cordéis. Sabe de cor romances que ninguém mais sabe e é também mestre de reisado (Folia de Reis). Azulão é velhinho e pequenino, mas na hora de cantar sua voz ecoa por todo o salão. Êta velhinho danado!
Fragmentos de “A Feira Nordestina, foi assim que começou” do Mestre Azulão
Quem quiser saber da feira Venha pra perto me ouvir Que vou contar em detalhes Sem aumentar nem mentir Mas num falar positivo Vou explicar o motivo Da nossa feira existir No ano quarenta e nove Vim pro Rio a vez primeira Fui visitar São Cristóvão Então por esta maneira Sem de nada conhecer Depois eu pude entender O começo desta feira Foi num dia de domingo Eu vim com meu primo João Pagar a passagem dele Que veio sem um tostão Nisso um motorista fala: – Vá lá pegar sua mala Que está no meu caminhão Eram dez horas do dia Eu vi um moreno forte Cercado de nordestinos Vindos no mesmo transporte Com uma lona no chão Vendendo fava e feijão Gritava: – Chegou do norte! Tinha até fumo de rolo Rede, rapadura e queijo Dizendo: – Aqui conterrâneo Este é puro e sertanejo Eu garanto a qualidade Você come e tem saudade Mata a fome e o desejo Algum já lhe conhecia Dizia: – Eu quero seu João, Comprava e lhe perguntava: – Tem chinelo e cinturão? Seu João dizia: – Não tem Mas esta semana vem No primeiro caminhão Eu observei um pouco Aquele povo comprar Uns chegando do nordeste Outros que iam voltar Tudo feliz e contente Numa árvore bem em frente a Senador Alencar Uns criticavam dos outros Com risada e brincadeira João Gordo vendendo as coisas Numa lona e uma esteira Outro vendilho chegou Foi assim que começou O início desta feira (…)
por Vitor Rebello