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Archive for Agosto, 2009

Em Julho, uma amiga cearense chamada Carolina Hilst trouxe para mim o cordel recém lançado sobre o Michael Jackson (valeu Carol!). Achando que tinha em mão um “furo de reportagem” pensava que o primeiro endereço na internet a publicar alguma matéria sobre esta obra ia ser o LERCORDEL. Porém, o tempo passou rápido demais e logo escreveram na nossa frente. É como conta a sabedoria popular, transmitida pela oralidade: “bobeou, dançou”, “camarão que dorme a onda leva” ou “quem dorme no ponto é chofer”. Portanto, para não deixar de mencionar que a morte do Michael Jackson já virou cordel, segue um artigo de Iuri Rubim (publicado no seu próprio blog) sobre o cordel do astro pop.

por  Vitor Rebello

A tradição da literatura de cordel é particularmente sensível aos momentos de comoção. Quando algum acontecimento, nacional ou internacional, mobiliza as massas, certamente um cordelista estará traduzindo em versos o ocorrido.

– O cordel tem também uma função jornalística. Há muito tempo, é um meio que o povo do sertão usa para se interar dos grandes acontecimentos. Foi assim com Lampião, Getúlio Vargas, Tancredo Neves e até com Leandro, cantor daquela dupla sertaneja – conta o cordelista alagoano João Gomes de Sá.

Pois foi o próprio João Gomes de Sá que, ao lado do companheiro Klévisson Viana, escreveu sobre a morte de Michael Jackson, um dos acontecimentos mais acompanhados, discutidos e lamentados da história recente.

Juntos, publicaram A Chegada de Michael Jackson no Portão Celestial. Apenas no primeiro dia após o seu lançamento, a obra teve 2500 folhetos vendidos nos pontos de ônibus de Fortaleza – local comum de venda de cordéis na capital cearense.

Eu sonhei que o rei do pop,
Logo após bater as botas,
Foi direto para o céu,
Fazendo muitas marmotas,
Cantando muito agitado
Feliz, tinha se livrado
De dívida, banco e agiotas.

– O que eu fiz foi uma releitura desse grande fato mundial. Apenas reproduzi algumas manifestações do sentimento do povo. Com alguns gracejos da minha parte – brinca o João Gomes de Sá.

Por “gracejos”, o poeta se refere a críticas – algumas sutis, outras nem tanto – a vários setores da sociedade brasileira. Uma delas é a existência de uma burocracia no Céu, que impediria a “admissão” rápida do cantor.

– É o que a gente vê hoje no país. No Brasil, a gente morre é na fila. Em todo canto tem essa burocracia. Daí fiz uma brincadeira com ele do tipo: “Como você já morreu mesmo, né, cara, não tem problema esperar mais um pouquinho” – explica.

As críticas também não deixam a crise do senado passar em branco. Pedindo atendimento privilegiado, Jackson pergunta a São Pedro se não haveria nenhum ato secreto em seu benefício.

Mas São Pedro eu sou um astro
Famoso no mundo inteiro!
Não tem um ato secreto
Para me atender primeiro?
– Aqui é outro processo
Não é aquele Congresso
Lá do povo brasileiro!

Para a surpresa deste Blog, o autor do cordel conta que não era fã de Michael Jackson.

– As minhas filhas chegaram a chorar com a morte dele. Mas eu nunca tive nenhuma relação com ele, apesar de reconhecer que era um grande astro e admirar algumas coisas que fez, com a canção “We Are The World”. Quando fiz o cordel, fui solidário com as pessoas que sofriam por ele – explica.

João Gomes de Sá não era fã de Michale Jackson, mas suas filhas sim

João Gomes de Sá não era fã de Michale Jackson, mas suas filhas sim

O poeta chegou a ser bastante criticado pela publicação do cordel. Outros poetas populares reclamaram da atenção dada a um astro internacional, quando ídolos como Luiz Gonzaga não tiveram o mesmo tratamento.

– Talvez seja mesmo um pouco de xenofobia. Mas o que eu não agüento é ouvir isso de poetas que sabem que a literatura de cordel trabalha com grandes acontecimentos – reage.

Eu queria dançar mais
Sabe o senhor, não empaco,
Gostava de requebrar,
Pois eu sou bom nesse taco
Dançando eu faço munganga,
Às vezes visto uma tanga
Para prender o meu saco!


Sincronia

A parceria de João Gomes de Sá e Klévisson Viana não foi programada nem combinada. Foi mais um daqueles acasos que só acontecem poucas vezes na vida.

Inspirado pelos noticiários e pela charge de um amigo, Gomes de Sá começou a fazer um cordel. Quando já tinha produzido boa parte da obra, ligou para Viana e descobriu que o colega poeta estava fazendo a mesmíssima coisa. Resolveram então publicar um cordel só, tamanha a sincronia.

As estrofes destacadas acima pertencem ao cordel “A Chegada de Michael Jackson no Portão Celestial”.


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